Uma tradição secular mantida sob o manto da fé e da luta de mulheres negras pela libertação dos seus irmãos escravos. Foi com essa missão que nasceu a Irmandade da Boa Morte em Cachoeira, no Recôncavo Baiano. Na noite desta terça-feira (13), primeiro dia da Festa da Boa Morte, uma missa lembrou as irmãs que já faleceram.
A festa, com apoio do Governo do Estado, por meio da Secretaria do Turismo (Setur), deve atrair cerca de 6 mil pessoas para acompanhar as tradicionais cerimônias, que seguem até sábado (17). Segundo a Setur, a expectativa é de que a taxa de ocupação da rede hoteleira chegue a 100% nesta quinta-feira (14), dia da procissão pelas ruas de Cachoeira e missa de corpo presente da Nossa Senhora da Boa Morte.
Nesta terça (13), vestidas de branco, as 32 mulheres que integram a Irmandade da Boa Morte saíram em cortejo da igreja da Nossa Senhora da D’Ajuda, acompanhadas pela imagem da Nossa Senhora da Boa Morte, com destino à capela que leva o nome da homenageada na festa.
Há mais de 10 anos na Irmandade, a professora Nice Santos herdou da mãe o amor e a dedicação pela Nossa Senhora da Boa Morte.
“Hoje é o dia que Nossa Senhora começa a adoecer e vestimos branco em homenagem a ela. O nosso ato de fé na missa é uma homenagem às nossas irmãs. Eu me sinto muito honrada e orgulhosa por estar nessa Irmandade, que é a minha vida e a minha história. Eu cresci aqui, ajudando a minha mãe”, afirmou a professora.
A missa foi celebrada pelo padre Hélio Vilas Boas, que destacou o momento de comunhão e acolhimento.
“A igreja, em nome de Cristo, parte do princípio que evangelizar é acolher. Como igreja, nós precisamos aprender a acolher e acolher bem, porque todos são acolhidos igualmente e sem acepção de pessoas no reino de Deus. A inciativa das irmãs pede da igreja a abertura e a comunhão para celebrar com elas aquilo que, para elas, é o depósito de fé. A cada ano, elas se esmeram para fazer bem essa festa, com dignidade, do jeito delas, com sua cultura, e cabe à igreja respeitar, apoiar e viver esse momento de riqueza da fé cristã-católica”. disse o padre.
Após a missa, foi servida uma ceia com peixe, pão, arroz, salada e vinho. Em respeito a Nossa Senhora da Boa Morte, é proibido o consumo de carne vermelha neste dia, que marca o período de convalescença de Nossa Senhora. Foram preparados 150 quilos de peixe para consumo das irmãs e do público que acompanhou o cortejo.
A professora Katrin Ferbemann levou um grupo de estudantes da universidade alemã em que leciona e ficou encantada com a festa. “Eu já estive na Bahia algumas vezes e amo esse estado. Já tinha ouvido falar da festa Boa Morte, mas é a primeira que participo. Eu tenho muito orgulho de dizer que vim da Alemanha para conhecer essa festa, que provoca sensações tão diferentes em nós. Não sei descrever o que estou sentindo aos assistir esses rituais”.
Repórter: Jairo Gonçalves