Filarmônicas na Bahia fazem parte de uma tradição centenária, sendo que a Erato Nazarena, em Nazaré das Farinhas, era até pouco tempo, a mais antiga em funcionamento em nosso estado. Até hoje em nosso país, tais agremiações são em boa parte dos municípios, as responsáveis pelo único acesso ao ensino de música. Daí, a importância e a necessidade de um olhar mais atencioso por parte de não apenas dos governantes, como também, da própria sociedade como um todo.
Na Bahia, com o advento da axé-music, em meados da década de 80, até os dias atuais, observa-se um crescente número de músicos egressos da banda de música para a integração com esses grupos. Um pouco antes, esse mercado de trabalho ficava praticamente restrito às bandas militares. No entanto, um olhar mais atento à realidade atual dessas sociedades, revela as dificuldades inerentes às mesmas.
Apesar dessa forte tradição, as filarmônicas sofrem como uma série de fatores socioeconômicos e culturais que tornam a sua existência, como geradora de cultura, um difícil desafio. Tais fatores vão da quase inexistência da educação artística nas escolas, até ao que se concerne à filarmônica inserida na sociedade, ao seu entendimento pelas gerações mais recentes.
Atualmente, observa-se a dificuldade na renovação e qualificação do mestre de música, educador musical responsável pelo direcionamento artístico dessas agremiações. Nomes como Heráclio Guerreiro (1877 – 1950), Amando Nobre (1903 – 1970), Tranquilino Bastos (1850 – 1935), Isaías Amy (1888 – 1960), Almiro Oliveira (1903 – 1993), Tertuliano Santos, Estevam Moura (1907 – 1951), Maestro Xaxá (1918 -) e Antônio Menezes( 1920 – 2004), dentre outros, são referências dessa tradição musical, através de seus discípulos, composições, transcrições e arranjos. Baseado nesse importante legado centenário é que torna-se necessária a criação de novas perspectivas tanto no aprimoramento da preparação técnica, como também, novas formas e maneiras de relacionamento com um novo público, quase sempre desprovido de um elo histórico com a banda de música.
No contexto atual, rodeado de tanta informação, entretenimento e consumismo é importante manter essa forte tradição musical, dialogando, percebendo e instigando com suas comunidades, em busca de um permanente organismo forte e atuante. Obviamente, que a conscientização dos responsáveis por essa cultura, passa por uma leitura atual, complexa e delicada do contemporâneo, começando pelas comunidades as quais estão inseridas.
A constante renovação do corpo musical, na maioria dos casos, é um dos atributos para a longevidade da filarmônica, sendo que a permanência de seus integrantes também está condicionada à permanência deles em sua cidade mediante uma atividade empregatícia. Outra questão importante é a necessidade de transmitir ao jovem aprendiz as raízes da banda, suas tradições, e a reflexão do que a mesma representa no atual contexto do contemporâneo. Tradição não é estagnar uma cultura ao longo do tempo por falta de meios, é necessário para mantê-la funcionando em constante diálogo com seus próximos!
Há algum tempo, várias agremiações vêm tendo dificuldades em manter um corpo musical, em virtude de questões supracitadas. Para exemplificar melhor, das três filarmônicas de Feira de Santana, duas estão sem qualquer tipo de atividade há anos, sendo que a terceira encontra-se com enorme dificuldade em manter-se. Cidades como Nazaré das Farinhas, Candeias, Tanquinho de Feira, têm suas sociedades musicais estagnadas ou sem funcionamento.
É necessário que as sociedades locais, junto aos respectivos municípios e ao governo tentem solucionar essa equação. Seria possível a formação de pólos aglutinadores para a discussão e fortalecimento dessas culturas? Alguém habilita-se?.
Sobre o autor:
Wellington das Mercês é Mestre em Educação Musical pela UFBA; Bacharel em Trompete pela UFBA; Especialista em Metodologia do Ensino das Artes – UNINTER; e ex-professor de Trompete do Colégio Estadual Manoel Novaes, em Salvador.
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7 respostas para “Artigo: Uma tradição centenária, “Filarmônicas na Bahia!””
Artigo extremamente importante e oportuno, pois o movimento musical das Bandas e Filarmônicas tem perdido terreno para a mediocridade musical que assola o Brasil nos últimos anos (30 anos?).
Quando vemos uma expressão musical autentica do Brasil, a música Sertaneja, se transformar em mera vulgaridade altamente rendável.
Que esperar do apoio à entidades fundamentalmente artísticas, como são as Filarmônicas, Bandas Marciais e Orquestras Sinfônicas?
Excelente artigo. Reflete a nossa triste realidade, nós “as filarmônicas”, estamos abandonados a própria sorte, nos faltam apoio e incentivo do governo do estado. Às vezes, acho que somos invisíveis e mudos, imagine que contraditório, nossas fardas são lindas, nossos dobrados encantadores, porém, não nos veem e nem nos ouvem.
A Filarmônicas por princípio deveriam estar vinculadas a Secretaria de Cultura do Estado, mas passaram a ser vinculadas a Secretaria de Trabalho Emprego e Renda.
Quem sabe se assim as Filarmônicas baianas, com seus centenários de existência, conseguissem uma parte dos 4 milhões ou mais que vão por ano para aquele projeto importado.
Já pensei até em fazer um protesto, todas as Filarmônicas na porta do Governador. É sacanagem o que vem ocorrendo.
Muito bom este artigo que vem como alerta, ao mesmo tempo descreve com riqueza de detalhes esta triste realidade. Parabéns professor Wellington! O movimento destes músicos nos centros, até mesmo na porta do Governador, como sugeriu o colega, seria um bom seguimento do alerta necessário.
Prezados amigos, sou José Mota, ex- presidente da Erato Nazarena, a filarmônica mais antiga da Bahia, fundada em 29 de agosto de 1863.
Estamos com nossa banda de música desativada por falta de novos instrumentos e de um profissional que nos oriente na elaboração de projetos para aquisição dos mesmos juntos ao governo federal e estadual.
Estamos com 52 alunos matriculados para a nova escola de música, esperando que o Socorro chegue e aí então possamos reiniciar nossas aulas e ensaios.
Se alguém tiver interesse em nos ajudar, ligue para Zé Mota, (75) 9 8371-3619. Ou pelo email: farmaciadozemota@hotmail.com
Sou músico de filarmônica há 49 anos.Parabéns Wellington!! Naquele vídeo que te enviei, em que mensiono a falta de apoio às filarmônicas, vejo você também mostrando o seu descontentamento, através desse riquíssimo texto. Na verdade, se todos as Filarmônica tivesse em seu município um eterno pai, como tivemos aqui em Irará. Estou falando de Dr. Deraldo Campos Portela, que com o seu dom natural (medicina), sem se preocupar com R$ , atendia a todos que em seu consultório chegassem em busca de atendimento, dedicou-se também a nossa filarmônica, mantendo-a por mais de 40 anos. Hoje nosso eterno presidente de honra, nossa comunidade nos abraçamos assim como a prefeitura ( todos gestores), mesmo assim, enfrentamos sérias dificuldades para nos manter em atividade. Os custos para aquisição de novos instrumentos e a manutenção, (reparos) são muito altos. Os naipes das madeiras necessitan da compra de palhetas, tornando inviável a sobrevivência sem uma política pública que ampare as Filarmônicas. Na minha visão, está faltando na Secretaria de Cultura do estado, um secretário que tenha conhecimento verdadeiro, sobre a importância das bandas de música, filarmônicas e sobre a cultura popular interiorana, focada nas suas raizes. Conhecendo melhor o trabalhoa e a importância que as Filarmônicas com a arte ‘ MUSICAL’ exercem acolhendo nossos jovens e contribuindo assim com o estado, formando homens do bem, para uma sociedade hoje tão carente!!
Ótimo artigo. As Filarmônicas são o som sinfônico do interior do Brasil. Além de participarem de vários momentos da vida social de uma comunidade e de ser o único Conservatório de Música que atende as crianças vocacionais, em muitos municípios, ela é, também, um valioso repositório de documentos musicológicos que guardam a memória musical do país.