A Secretaria Nacional do Consumidor, vinculada ao Ministério da Justiça, determinou nesta terça-feira, dia 2, que o Google sinalize como “publicidade” os conteúdos produzidos e veiculados pela empresa com críticas ao projeto de lei das Fake News.
O Google também terá que veicular, em até duas horas após ser notificado pelo governo, “contrapropaganda […] voltada a informar devidamente os consumidores o interesse comercial da empresa no que concerne à referida proposição legislativa.”
Em nota, o Google disse que “são falsas as alegações de que está ampliando o alcance de páginas com conteúdos contrários ao projeto de lei das fake news”.
A Câmara pode votar ainda nesta terça o projeto de lei, que cria regras para criminalizar a divulgação de conteúdo falso e responsabilidade as redes por irregularidades não combatidas nesses ambientes virtuais.
Ao longo dos últimos dias, e até o início da tarde desta terça, a página inicial do buscador exibia a mensagem: “O PL das fake news pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”.
Clicando no texto, o usuário é levado um artigo do dia 27 de abril contra o projeto de lei. O texto não informa o interesse do Google no tema. Nesse artigo, há link para um outro, chamado “Como o PL 2.630 pode piorar a sua internet”.
Pouco após o anúncio da decisão da Senacon, o link foi retirado do ar.
Em nota, o Google afirmou que são “falsas” as alegações de que a empresa estaria ampliando, nas buscas sobre o tema, o alcance de páginas com conteúdo contrário ao PL das Fake News.
O Google também diz que o material assinado pela própria empresa sobre o tema é uma manifestação “pública e transparente” da visão da organização sobre o tema.
A decisão foi anunciada em coletiva nesta terça pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, e pelo secretário Nacional do Consumidor, Wadih Damous. O documento estabelece multa de R$ 1 milhão por hora de descumprimento das determinações.
“No caso de anúncio publicitário contra o PL 2630, veiculado na página de abertura do buscador Google, não há transparência, trata-se de informe publicitário do próprio Google manifestando sua posição quanto o PL, sem nenhuma sinalização”, diz a decisão da Senacon. “No caso de publicidade paga, usualmente o resultado do Google informa que há patrocínio. Nesse caso, não há informação nenhuma sobre o caráter publicitário do material”, prossegue.
A decisão da Senacon faz cinco determinações ao Google. A empresa: deve sinalizar os conteúdos publicitários próprios, e informar o consumidor sobre “eventual conflito de interesses que afetem a prestação de seus serviços”; deve informar “qualquer interferência no sistema de indexação de buscas relativas ao PL 2.630″; fica proibida de censurar “posições divergentes da posição editorial da empresa” em comunidades e apps mantidos pela plataforma digital sem informar devidamente o consumidor; fica proibida, da mesma forma, de privilegiar posições convergentes nas mesmas comunidades e nos apps sem informar o consumidor; fica obrigada a veicular a “contrapropaganda” no caso já identificado de publicidade não sinalizada – ou seja, no caso do PL das Fake News.
Na decisão, a Senacon também instaura um processo administrativo regular contra o Google e dá prazo de 20 dias para que a empresa apresente defesa.
O ministro da Justiça, Flávio Dino citou na coletiva desta terça que o governo se deparou com “dezenas, quiçá centenas de indícios de que algumas empresas estariam privilegiando a sua própria decisão e manipulando seus próprios termos de uso para privilegiar aquilo que lhes convém, em detrimento de outras vozes”.
“Isto é censura, e é dever da Secretaria Nacional do Consumidor garantir que ninguém manipule a liberdade de expressão no Brasil. Há uma tentativa de inverter os termos do debate, como se nós quiséssemos censura. Ao contrário: o que estamos evitando é uma censura privada e clandestina, não assumida”, declarou.
“Não estamos aqui tratando se o projeto de lei 2.630 é bom ou ruim. Essa é uma decisão que cabe à Câmara, claro que nós temos uma posição conhecida. O que estamos tratando é se as empresas podem manipular, ou tentar manipular os consumidores para fortalecer suas posições, e impedir o livre debate na Câmara”, prosseguiu.
O Projeto de Lei das Fake News já foi aprovado no Senado e é discutido na Câmara dos Deputados há mais de três anos. No fim de 2021, um grupo de trabalho montado na Câmara para tratar do tema aprovou uma versão anterior do texto.
Na semana passada, deputados aprovaram, por 238 votos a 192, o pedido de urgência da matéria, o que permite que o texto seja votado diretamente no plenário, sem passar por comissões. O deputado Orlando Silva, relator da proposta, apresentou seu parecer sobre a matéria.
Em linhas gerais, o relatório obriga que provedores sejam representados por pessoa jurídica no Brasil; criminaliza a divulgação de conteúdos falsos por meio de contas automatizadas, as chamadas contas-robô; responsabiliza os provedores pelos conteúdos de terceiros cuja distribuição tenha sido impulsionada por pagamento; determina que as plataformas digitais mantenham regras transparentes de moderação; determina a retirada imediata de conteúdos que violem direitos de crianças e adolescentes; estabelece remuneração pelo conteúdo jornalístico utilizado por provedores; estende a imunidade parlamentar às redes sociais; deixa claro que a liberdade de expressão é direito fundamental dos usuários dos provedores e que as proibições presentes não lei não podem restringir: o livre desenvolvimento da personalidade individual; a livre expressão; e a manifestação artística, intelectual, de conteúdo satírico, religioso, político, ficcional, literário ou qualquer outra forma de manifestação cultural.
Em nota, a Meta, dona do Facebook, disse que não permite atividades fraudulentas, e que é preciso um debate amplo para garantir uma lei que melhore, e não piore a internet.
Na semana passada, um conjunto de associações que representam empresas de jornalismo divulgou um manifesto em que defendeu o PL das Fake News. Segundo as empresas, o projeto é necessário “diante dos efeitos dramáticos da desinformação e do discurso de ódio” na sociedade.
Afirmou ainda que a valorização do jornalismo profissional serve como “antídoto a essa epidemia social”.
“Como já ocorre em outros países, a remuneração da atividade jornalística por plataformas de tecnologia pode ser um elemento decisivo para a formação de um ecossistema jornalístico amplo, diverso e saudável, capaz de se opor à difusão da desinformação e dos discursos de ódio. Tal ecossistema é essencial para a manutenção da própria democracia”, afirmam as empresas no manifesto.
Edição: Pietra Dantas – estagiária | Supervisão: Hélio Alves/ Tribuna do Recôncavo | Fonte: G1.