Fraqueza, pressão baixa, tontura, dor no estômago e dor de cabeça são alguns sintomas imediatos da fome. A longo prazo, o impacto da desnutrição pode ser muito maior, principalmente em crianças.
Um estudo do Laboratório de Plasticidade Neural da Universidade Federal Fluminense (UFF) aponta que os danos provocados pela desnutrição ao cérebro, especialmente se ocorridos na primeira infância, podem ser irreversíveis, afetando o desenvolvimento cognitivo — isto é, a capacidade de aprender, absorver informações e responder a desafios cotidianos (leia detalhes abaixo).
“A fome é uma condição desumana. Não há nenhuma justificativa para um país que produz tanta riqueza como o Brasil ter pessoas passando fome”, afirma Claudio Alberto Sefarty, neurocientista e professor da UFF.
O professor Claudio Alberto Sefarty, da UFF, explica que períodos críticos da infância são aqueles em que as conexões do cérebro se formam. Essas conexões se dão ao longo do desenvolvimento inicial das crianças, sobretudo nos primeiros anos de vida. É nesse período que a criança aprende a falar, a andar e a experimentar coisas novas.
“O cérebro da criança é superplástico. Então, a criança não só aprende com muita facilidade, mas todas as conexões vão se adaptando com o uso e com a experimentação, e esses estímulos incluem os elementos necessários da alimentação”, esclarece.
À frente da pesquisa que mostra os danos provocados pela desnutrição ao cérebro, ele reforça que a má alimentação causa alterações irreversíveis na plasticidade neural.
“Percebemos também que existem danos seletivos causados pela falta de alguns elementos nutricionais, que são os nutrientes essenciais: triptofano e ácidos graxos ômega-3. Então, a falta desses nutrientes também pode deixar danos permanentes”.
Em 2022, o Brasil voltou ao Mapa da Fome, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Isso quer dizer que o percentual de brasileiros que não têm certeza de quando vão fazer a próxima refeição está acima da média mundial.
Os dados da fome no Brasil são alarmantes: Mais de 33 milhões de pessoas passam fome (Rede Penssan); 125 milhões de brasileiros que não têm comida garantida todo dia (Rede Penssan); Pobreza ou extrema pobreza atingem 10 milhões de crianças com até 6 anos no Brasil (IBGE); Em média, todos os dias, 11 crianças menores de 5 anos são internadas por desnutrição (Sociedade Brasileira de Pediatria); Três em cada dez famílias enfrentam insegurança alimentar moderada ou grave (Rede Penssan); 21 milhões de pessoas que não têm o que comer todos os dias (ONU); 10 milhões de pessoas estão desnutridas no país (ONU).
Após 30 anos, o país voltou a atingir seus piores índices. Especialistas ouvidos pelo g1 analisam que o quadro foi impulsionado pela crise econômica, pela pandemia de Covid-19 e pela falta de implementação e manutenção de políticas públicas no combate à fome.
“A gente está num país historicamente desigual, onde a fome e a miséria existem há décadas, e eu acho que só invertendo os valores e colocando não a economia, não a política, mas a solidariedade como um valor universal é que a gente consegue avançar”, avalia Daniel Carvalho de Souza.
É através do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), existente desde 1955, que refeições são oferecidas aos alunos matriculados no ensino básico da rede pública.
O programa é considerado por especialistas uma das políticas públicas mais relevantes no que diz respeito ao direito à alimentação. De acordo com o governo federal, o PNAE contribui para o crescimento, o desenvolvimento, a aprendizagem e o rendimento escolar dos estudantes, além estimular hábitos alimentares saudáveis.
Daniel Carvalho de Souza, presidente do conselho da ONG Ação da Cidadania, e Francisco Menezes, economista e consultor da ONG ActionAid, alertam o impacto positivo da merenda escolar na sociedade. Para eles, o programa tem um papel fundamental no combate à fome no Brasil.
Menezes alerta que “a desnutrição já começa a ser gerada no processo de nascimento da criança, com a mãe desnutrida”.
O economista adverte que, com o número recorde de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza, há um risco de sequela geracional, uma vez que a desnutrição pode comprometer de forma definitiva as capacidades físicas e mentais de crianças.
A alimentação escolar tornou-se um direito dos alunos da rede pública em 1988, com a promulgação Constituição.
Editado pelo Tribuna do Recôncavo | Fonte: G1.