Por Dra. Lívia Salomé – médica
Quando falamos em coronavírus, inevitavelmente, pensamos na infecção causada pelo vírus e os tradicionais sintomas, como falta de ar, alterações de olfato e paladar, tosse e sintomas de gripe em geral. Mas o impacto da covid-19 vai muito além. Com a pandemia alterando nossa rotina, as incertezas, inseguranças e stress, muitas outras doenças têm surgido – ansiedade, depressão e insônia – e desequilíbrios – como distúrbios alimentares e consumo excessivo de álcool e cigarro.
Ainda pouco acolhido e cheio de tabus, os vícios nascidos ou potencializados desde o começo da pandemia merecem uma atenção especial. Uma pesquisa feita em agosto do ano passado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) com 44.062 brasileiros, mostra que quase 35% dos entrevistados que já eram fumantes, passaram a consumir mais cigarros por dia desde o início do isolamento social. Entre eles, 6,4% aumentaram em até cinco; 22,8% somaram mais dez por dia e 5,1%, em 20 ou mais.
“Para quem já traz uma predisposição ao vício, a situação que estamos vivendo é um solo fértil. Se situações de estresse pré-pandemia já eram desafiadoras para esses pacientes, o isolamento social as potencializa e vira um ciclo vicioso: a insônia, depressão e ansiedade levam a fumar mais e o fumar mais também leva à depressão, insônia e ansiedade. Nesses casos, buscar ajuda médica é fundamental para evitar a piora do quadro e o surgimento ou agravamento de doenças”, explica a especialista em Medicina do Estilo de Vida e vice-presidente do Colégio Brasileiro de Medicina do Estilo de Vida, Dra. Lívia Salomé.
Mas o abuso do cigarro e até mesmo do álcool não ficam isolados. Outros dados que assustam são do Ministério da Saúde que mostram que entre março a junho de 2020, o atendimento por uso de alucinógenos cresceu 54% em relação ao mesmo período do ano passado. Já o uso excessivo de sedativos, cresceram em 50%. Mas não são só os brasileiros que estão nesse cenário, alguns estudos a nível mundial mostram que o consumo de maconha aumentou em 36% no mundo nos primeiros seis meses de pandemia.
“Todas essas pesquisas nos dão uma amostra da gravidade que estamos enfrentando, mas é bem provável que os números engordem quando pensamos nas pessoas que não pedem ajuda ou têm vergonha de se expor, com medo de julgamentos. Infelizmente, nossa sociedade carrega preconceitos e não enxerga como doença. E isso gera ainda mais estresse e ansiedade nesses pacientes, dificultando ainda mais o tratamento”, reforça a médica.
Para quem está enfrentando essa situação ou conhece quem esteja precisando de ajuda, o conselho da especialista é buscar ajuda médica especializada para cuidar do vício e entender o que está causando isso.
“Tratar o vício é como controlar um incêndio: é preciso apagar o fogo mais intenso para achar o foco, o que está causando. Só assim, o paciente pode ter uma vida com mais saúde e longevidade. Nesse ponto, a Medicina do Estilo de Vida pode ajudar trazendo um olhar plural e integrativo para esse paciente, com prognósticos que contemplam todas as dificuldades, minimizando as chances de recaída”, completa a especialista.
Portanto, se você está desconfortável com a situação, busque ajuda profissional. Isso não é sinal de fraqueza e não há motivos para ter vergonha, ainda mais em meio à maior pandemia do século. E se você conhece alguém que não está feliz com essa situação, acolha sem julgamentos e ofereça ajuda para encontrar um profissional para dar todo suporte.
O que é a Medicina do Estilo de Vida?
A Medicina do Estilo de Vida (MEV) é uma abordagem interdisciplinar que tem como alicerce o estilo de vida saudável para prevenir, combater e até mesmo reverter doenças crônicas, resultando em longevidade com saúde. Essa abordagem é sustentada por seis pilares: alimentação saudável com uma dieta baseada em plantas; atividade física regular; qualidade do sono; saúde mental; controle de tóxicos e relacionamentos – todos com embasamento científico.
O objetivo da especialidade vai além de uma relação de diagnóstico e prognóstico: o foco é criar uma relação onde o médico possa conhecer seu paciente de forma integral e mais profunda, desenvolvendo soluções estratégicas para o equilíbrio do corpo e mudança do estilo de vida. A MEV traz o paciente como principal elemento deste processo e, por isso, é possível mesmo a reversão de doenças crônicas, até então, tidas como “incuráveis”.
Sobre a autora
Dra. Lívia Salomé é graduada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), tem especialização em Clínica Médica e certificação em Medicina do Estilo de Vida pelo American College of Lifestyle Medicine. Atualmente, é vice-presidente da Regional Minas Gerais do Colégio Brasileiro de Medicina do Estilo de Vida (CBMEV).
Matéria: Yara Simões/ Doppler Saúde Mkt